domingo, 6 de abril de 2014

“O cheiro que as Mães têm”

(7h da manhã do 6º dia após a partida)


Entre tantos pensamentos que tenho tido, ao longo destes últimos seis dias da partida para o encontro com Deus de minha pérola preciosa, nesta manhã de domingo, em oração, o bom Deus - e a Virgem Maria, com certeza na intercessão, recordou-me da minha infância. E que infância! Gostosa de lembrar – como na vida da maioria das pessoas que conheço, e que se perdem em alegria e emoção nas suas lembranças.

Porém, nesta manhã, ao recordar minha infância, ela tinha cheiro. Cheiro? Cheiro do quê? Cheiro de amamentação. Cheiro de Mãe. Sim, pois, fugindo as expectativas nutricionais, tive a alegria de ser amamentada até os três anos e seis meses de idade - tempo em que mamãe ainda trabalhava na fábrica de tecidos, Companhia América Fabril.

Recordo-me que minha mãe chegava no horário de seu intervalo para “almoço” às 9:30h, pois entrara às 5h, e sairia às 13:30h. Que horário esperado. Quando a cirene da fábrica tocava, lá estava eu, menininha de três aninhos, esperando seu cheirinho com gosto de alimento. Afinal, esta criança já se alimentava com tudo mais que uma criança de três anos já se alimenta, então, a amamentação não era mais nutricional, mas sim afetiva. A amamentação era o elo entre as duas, mãe e filha. Ligação que fez das duas, ao longo de cinquenta e um anos, um elo de amizade plenamente compreensível. Elo que criou dependência de ambas as partes.

O interessante é que nesta manhã, quando o bom Deus permitiu-me tal recordação, a memória olfativa se misturava com a memória reflexiva, como tantas vezes já foram sentidas. Mas hoje, neste momento de saudade, esta lembrança misturou-se com a espiritualidade e afetividade de inúmeros filhos e mães, mas a que impulsionou-me – com certeza inspirada pelo Espírito Santo de Deus, meu adorado companheiro de viagem – foi a relação de afetividade de Jesus Menino e sua doce Mãe, a Virgem Maria.

Se em meu olfato está perene o cheiro de minha mãe, e aquele colóquio de amor e ternura, de olhares se entrecruzando durante a amamentação, penso que com Jesus, quando homem em suas caminhadas, de idas e vindas da Galiléia para a Judéia, não tenha sido diferente. O laço da amamentação de uma mãe com um filho é único, e se traduz na missão que ela terá em educá-lo e em mostrá-lo o caminho a seguir.

No coração da Virgem Maria estavam presentes as palavras do anjo, que continuamente a fazia recordar-se da missão de seu Filho: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-se-á Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai Davi; e reinará eternamente na casa de Jacó, e o seu reino não terá fim (...) O Espírito Santo descerá sobre ti, e a força do Altíssimo te envolverá com a sua sombra. Por isso o ente santo que nascer de ti será chamado Filho de Deus.” (Lc 1,31-33.35)

Ser e fazer aquilo que Deus quer, era aquilo que fazia parte da vida da Virgem Mãe.  Ser e fazer aquilo que Deus quer, é a missão de todas as mães. E com isso, agradeço ao bom Deus por inspirar nas mães esta doce certeza de ‘Ser e fazer aquilo que Deus quer’. E agradeço, neste momento em que vivemos, da recente partida, a mãe que me amamentou, e deixou em mim o seu cheiro, o cheiro da amamentação e da responsabilidade de ser mãe.

Como a Virgem Maria, eu creio em tudo o que o Senhor inspira no coração de uma mãe, e que em mamãe se deu na educação de cada um de nós seus filhos. Afinal, em nossa educação estava sempre presente, entre ela e nós, o santo Temor de Deus, que nos faz amar e respeitar a Deus sobre todas as coisas, reconhecendo o valor filial divino, para que depois sim reconhecer o valor filial humano.

Olho no olho, momento da amamentação (duradoura ou não), momento do ninar para dormir, momento do soninho no cantinho da cama, são momentos de colóquio maternal jamais esquecido pelos filhos biológicos ou não, pois trazem em si uma missão, repito: A missão de serem e fazerem a Vontade de Deus. Encerro assim com os exemplos de nosso Senhor Jesus Cristo, que tendo sido amamentado, cuidado e ensinado por sua doce Mãe, jamais perdeu de vista aquilo que ela, com toda certeza, repetiu-lhe muitas vezes. Já na fase adulta, após ensinar a oração do Pai-Nosso aos discípulos que queriam aprender a orar, e falar-lhe da importância do saber pedir e suplicar, com insistência, para receber do Pai do Céu o que for necessário, Jesus manifesta o seu poder divino expulsando um demônio mudo. Enquanto ele assim falava, uma mulher levantou a voz do meio do povo e lhe disse: “Bem-aventurado o ventre que te trouxe, e os peitos que te amamentaram!” (Lc 11,27) Com toda certeza, Jesus o sabia, e recordou-se, mas haveremos de lembrar que aquele elo com sua Mãe se traduziria na importância de sua missão, e que já estava sendo colocada em prática, e Jesus replicou: “Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a palavra de Deus e a observam!” (Lc 11,28) Afinal, a maternidade traz em si uma missão, a de apontar ao “fruto do seu ventre” aquilo que precisa ser cumprido. Assim, encerro dizendo que “O cheiro que as Mães têm”, é mais que humano, pois trata-se de um cheiro divino, cheio da presença de Deus.

Estela Márcia (8:35h, 06 de abril de 2014)

 

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